
A Praia da Ponta Ruiva fica na costa ocidental do Algarve, uma das ultimas antes da ponta de Sagres, chega-se lá a partir de Vila do Bispo por caminhos de terra que cruzam o ondular suave das colinas até se chegar á costa. Passamos pequenas casinhas aqui e ali e um ou outro ribeiro, quem tiver a sorte de o fazer ao final do dia deparar-se-á com o espectaculo mágico e único de ver o sol beijar o mar. Sentir os cheiros da erva molhada a misturarem-se com os da maresia e o rebentar do mar completam um cenário idilico num paraiso perdido a sul.
Existe do lado esquerdo da praia uma grande rocha bicuda e avermelhada devido ao oxido de ferro, que entra pelo mar dentro (daí Ponta Ruiva) imponente a contrapor-se ás ondas gigantes que muitas vezes contra ela batem, um dia também cederá inevitavelmente, mas enquanto não, ajuda a onda a erguer-se ainda mais e a quebrar formando verdadeiras ladeiras de agua polida para o lado esquerdo de quem a "surfa", o ruido do espumáço a trás de ti a querer engolir-te é assustador, mas a ladeira de água é quase interminável e a esquerda continua e já vais quase a meio da praia, mas há que sair atempadamente, prolongar a onda significaria entrar para dentro de uma especie de máquina de lavar programada para não parar mais, a sequencia interminavel de ondas a rebentar em clouse-out a partir dali é muito grande e soma-se a isso o "agúeiro", que é a corrente contraria á ondulação de toda aquela água que as ondas trouxeram e que agora retorna completamente invisivel a quem ali tomar banho e não conhecer as manhas deste mar, depois de se entrar na corrente muito dificil é sair, o cansaço e o break-point fazem o resto.
Básicamente era isto que que ia acontecer aos meus amigos Sátia e Rui Pedro não os tivesse eu ido lá buscar e rebocar in extremis para um sitio mais seguro. Hoje já cá não estariam.
Davam os primeiros "passos" no que se refere a descer ondas em cima de uma prancha, entraram na água para fazer body-board por onde toda a gente entra que é junto ás rochas do gigante vermelho, e se a maré estiver vazia, por cima delas, mas com muito cuidado com os ouriços e lismos para não nos partir-mos todos caso o pé seja indevidamente pousado onde não se deve. Em vez vez de ficarem quietinhos na água e esperar pela ondulação começaram a movimentar-se os dois no outside para a esquerda e para o centro da praia, talvez com receio das rochas, estavam a ir direitinhos para a boca do lobo.
No inicio não liguei porque os via sempre muitos juntinhos a dar ao pé, ou melhor á barbatana, e por isso pensei que estariam seguros, mas de repente vi o bracinho de um deles no ar a dizer adeus, ao que eu respondi com outro acenar, o bracinho voltou a erguer-se e olhando melhor, vi que afinal o gesto não era tanto de adeus mas mais de - anda cá buscar-nos . Deviam estar a menos de dois minutos de entrarem no programa de centrifugação, a corrente estava a puxa-los a partir de fora para terra precisamente para a zona dos close-outs. Por fora, num instante cheguei lá perto deles e eu próprio vi a coisa mal parada para o meu lado, o grupo deve ter estado a menos de dez metros do break-point, e a força da corrente naquele sitio era cada vez maior.
Saí dali a remar primeiro para o outside com cada um deles agarrado por baixo aos fins laterais e ao mesmo tempo que lhes gritava para darem ás barbatanas porque eu sózinho também não teria tido força para puxar aquele peso todo dali para fora só com a pagaia. Saímos por onde entrámos junto á rocha. Já cá fora, abraçamos-nos os três e agradecemos a Deus ter-nos dado nova oportunidade.
Hoje em dia o Rui Pedro gere uma fazenda de gado em Angola e o Sátia tira fotografias das estradas de Portugal de carro com uma máquina de disparo 360º presa no tejadilho para o Google Earth.
Eu também faço muitas coisas.
Aloha.
ps. Aqui fica então o link de um video gentilmente cedido pelo Gus Presa de uma surfada sua na Praia da Ponta Ruiva.